sexta-feira, 23 de setembro de 2016

DEIXEM O PALERMA FALAR!

Tenho pensado muito em palermas nos últimos tempos. Qual a melhor forma de lidar com um palerma? Devemos ignorar um palerma, mesmo que ele não nos deixe em paz? É possível livrarmo-nos de um palerma, sem termos de o matar? São dúvidas para as quais tenho procurado resposta e até agora cheguei a estas parcas conclusões: não sei; talvez; sim!

Tudo começou com um cartoon no DN. Nem era preciso o desenho para ter piada. Ou se calhar era, mas vou tentar na mesma. Mostrava três talibans e o mais velho dizia aos dois mais novos: “Se querem que um livro se torne eterno, atirem-no a uma fogueira”. O livro era o Corão, a frase não sei se era mesmo esta, mas a ideia era.
Acontece o mesmo com as pessoas. Se quiserem fazer de um palerma, um herói, ameacem-no de morte.
Às vezes nem é preciso ir tão longe. Experimentem só proibir um palerma de falar. É um bocado como aquele mito das formigas. Se mandas calar um palerma, aparecem logo mil palermas a defendê-lo. São muito corporativos os palermas. Por isso é sempre bom deixar o palerma falar até ao fim. E, depois do palerma acabar, bocejar, espreguiçar bem os braços e ir embora. 
Nunca – mas mesmo NUNCA! – ameaçar a integridade física do palerma. É o pior que se pode fazer. A partir daí obrigamos todas as pessoas de bem, a tomar uma posição, para defender um palerma. As pessoas de bem não merecem que lhes façam isso. Com toda a certeza devem ter coisas mais importantes a fazer na vida do que defender palermas.

Tenho também uma outra técnica para lidar com palermas, mas ainda está em fase experimental. Funciona assim: o palerma vem para falar comigo e eu faço de conta que sou autista. Olho para ele fixamente de olhar perdido no vazio – às vezes até me babo um bocadinho, para dar mais credibilidade à cena – e não digo nada. Tenho tido bons resultados, mas pode ser um processo moroso.
 
E toda esta preocupação com palermas por quê? Prometi a mim mesma, numa resolução de um ano novo qualquer, não defender palermas. Criminosos tudo bem. Palermas? NUNCA! Mas tem sido muito difícil manter a minha resolução. Todos os dias é um novo palerma que aparece a precisar de defesa. Bem sei, não são tempos fáceis para os palermas e alguém tem de os defender, mas faço aqui um apelo: Por favor, não mandem palermas para o Tribunal, só por serem palermas!
O pior pesadelo de um advogado é ter de defender um palerma em juízo. A única coisa pior que defender um palerma, deve ser apanhar um juiz palerma. E agora que penso nisso, até acho que deve ser melhor apanhar um juiz palerma. Pelo menos do teu lado está tudo controlado.

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

I LOATHE EU

Quando uma pessoa pensa que já viu palermas de todos os tipos, com cartazes na rua, a vida vem e surpreende-nos todos os dias com novos exemplos de palermas e os cartazes que eles trazem para a rua. Dos palermas todos a segurar cartazes na rua, os "I love EU" são os meus favoritos. Têm aquele cheirinho a América Latina, onde até já começa a ser raro ver propaganda destas nas ruas. É mais coisa para a Coreia Norte, o amor aos líderes e às instituições. E em Angola também se usa muito, diz que há muito amor ao "Zédu" por aqueles lados, seja lá o que isso for. Na Europa é uma estreia. É uma ideia que eu deixo àquela malta da ONU, de um novo critério para apreciar o desenvolvimento das nações: o amor que um povo nutre pelos seus líderes e pelas instituições que os governam.
Tenho de confessar que eu congelo um bocadinho por dentro, sempre que vejo um palerma com um cartaz a dizer: "I love EU". Uma pessoa anda há anos a tentar convencer-se que isto não está a caminhar para a união soviética e depois surgem estas marchas a dizer: "We love EU" e todos os meus argumentos caem por terra... Tantos ditadores ao longo da história e foi preciso um gajo raptar meia dúzia de pessoas, em Estocolmo, para termos um nome bonito a descrever o conceito de xonés.   

Lembra-me uma música que reza assim: "Never tell the one you love that you do, save it for the deathbed". Não sou ninguém para vos dar conselhos sobre a vossa vida intima, como o Matt, mas é um bom princípio para ser aplicado à política. Haverá certamente bons políticos no mundo, a fazer um bom trabalho e sabem qual a atitude de um país do primeiro mundo, para com estas pessoas? Não é nenhuma. Afinal não fazem mais que a sua obrigação. É uma das chatices do serviço público. O nome já diz tudo, a pessoa faz bem e não faz mais do que a sua obrigação.
Imaginem que um dono de uma PME, com cerca de 20 empregados, aparecia um dia no armazém com um cartaz a dizer: "O Adalberto é o melhor empregado do mundo e eu amo-o por isso". Nunca aconteceu, nem vai acontecer, pois além de pregar um susto de morte ao Adalberto, o mais certo é que o Adalberto não fizesse mais nada de jeito no trabalho a partir daí. Acontece o mesmo com a política e os políticos. Não sejam groupies! Estragam a vossa vida e a minha também. Sobretudo os fãs do Professor Marcelo, até fico agoniada com tanto afecto. Credo! A sorte é que ele não atira ao fascismo ou estava tramada com vocês. 
O máximo de afecto que uma pessoa deve ter por um político é dar-lhe uma galheta no cachaço e dizer: "Presta atenção à tua vida, pá!" Mais do que isto acho que é estragar.

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Uma História Simples

Já lá dizia o poeta: "Art is no excuse for boring people"!

Se calhar quem dizia isto não era um poeta, mas lembro-me que falava inglês. E quase posso apostar, devia ser norte-americano. Eles sabem melhor do que ninguém, que a arte, seja a pintura, a literatura, a música ou o cinema, não precisa de dar grandes respostas sobre o sentido da vida, nem de uma história surpreendente, a única coisa que se pede a um bom artista, é para não entediar as pessoas. Tudo se desculpa, cenas chocantes, temas tabus, pura parvoíce, o que quiserem. O que não se aceita é pregar uma grande seca às pessoas.

O cinema português precisa, urgentemente, de alguém que entenda isto. Perdi a conta das vezes que saí frustrada de uma sala de cinema, por causa de um português. Durante muitos anos até me escondia debaixo da cama, de cada vez que ouvia as palavras cinema e português na mesma frase. Ou o filme tem uma boa história e está mal representado ou os actores são muito bons e a história é uma pasmaceira.
Já nem falo daqueles casos, em que não entendes nada da história que o filme tenta contar. Isso não é necessariamente mau. Nunca percebi nenhum dos filmes do David Lynch, mas também nunca olhei para o relógio a meio de um deles a pensar: “Quando é que esta merda acaba?!”
Podes não entender nada do filme, mas ficas ali agarrado até ao fim, na esperança de entender. E quando o filme acaba sentes pena, porque achaste que desta vez é que era, ias mesmo entender um filme do David Lynch, mas não.

Uma vez fui ao cinema com a gorda e um amigo que adora o David Lynch, para ver o Inland Empire. Estávamos os três no cinema e quando aparece aquela cena dos homens vestidos de coelho, a gorda, com um ar assustado, pergunta-me: “Estás a perceber isto?!” – E eu olhei para ela, com o meu ar mais snob e disse bem alto no meio do cinema: “A sério!!! Não tás a perceber?!” – E desatamos os dois a rir. O meu amigo achou que estávamos a gozar com o filme e não nos falou durante duas semanas. A malta cinéfila leva o David Lynch demasiado a sério.    
Eu também levo. É de louvar uma pessoa que constrói uma carreira, a fazer filmes que ninguém entende. Aliás, uma série de televisão inteira, que ninguém entendeu e ninguém esquece. Saudade! Não iam fazer um remake?

Há uns 10 anos atrás, lembro-me de estar a vegetar pelo sofá, quando li no jornal: “História Simples de David Lynch, 15:30, Gulbenkian”. Mal a comparado, esta informação no meu cérebro teve o mesmo efeito que a frase: “Deus na praça do comércio! “, teria num ateu.
Gosto das histórias do David Lynch e se há coisa que sonho desde sempre, era uma história simples, que eu conseguisse entender. Saltei mesmo do sofá e fui em busca da história simples. No caminho ainda pensei pra comigo, se não seria publicidade enganosa? Algum intelectual da Gulbenkian… sabe-se lá o que eles consideram uma história simples… Mas era mesmo. Até me vieram as lágrimas aos olhos.

Tudo isto do David Lynch, para dizer o quê? Para dizer que até ele, uma vez na vida, desceu à terra para fazer uma história com princípio, meio e um final bonito. Será assim tão difícil?!