segunda-feira, 23 de maio de 2016

A ESCOLA DO MEU FILHO ESCOLHO EU (E PAGAS TU)!

No meu tempo, as escolas privadas existiam, para que os filhinhos burros dos papás ricos, que quisessem tirar um curso superior, não fossem obrigados a frequentar sociologia, na Universidade da Beira Interior. Muita coisa mudou desde então… E quando o principal argumento, para defender que o dinheiro público seja investido em escolas privadas, é o da competitividade e da consequente qualidade e eficiência do serviço público em causa, só podemos estar pior. Outra coisa que não acontecia no meu tempo era discutir-se o serviço público de ensino, com os mesmos critérios com que se fala de combustíveis e telecomunicações.

“ A escola do meu filho, eu é que escolho!” – e o que eu quero saber é: Quem é que vai pagar isso?! Estou a brincar, não é nada. Era só para me armar em boa.
De todos os argumentos em defesa da escola privada, este é o mais tonto. A escola pública não existe para impedir que os pais extremosos possam escolher livremente as escolas dos seus petizes. Pelo contrário. Existe para garantir, que um ensino de qualidade chega a todos, mesmo àqueles cujos progenitores não se pudessem estar mais a c#$%& para a qualidade da escola das suas criancinhas.
A ideia de um serviço público prestado pelo Estado, seja ele de saúde, de educação, de justiça ou segurança, não é impedir que as pessoas façam livremente as suas escolhas. É garantir um serviço de qualidade, a quem não tem poder de escolha.    
E só é possível garantir um serviço público de qualidade a todos os cidadãos, se os critérios de acesso não forem os mesmos da livre concorrência e dos mercados. Até porque, como é fácil de ver, uma má escola ou um mau hospital, não são a mesma coisa que um mau restaurante ou um mau cabeleireiro, por muito trágicos que esses serviços às vezes consigam ser.

Se os cidadãos podem escolher livremente a escola dos seus filhos, porque não hão-de escolher livremente o Tribunal ou a esquadra de polícia onde querem apresentar queixa? Por que há de um cidadão recorrer ao Tribunal da sua Comarca, se o da Comarca ao lado é mais rápido e o juiz até é amigo do meu primo? E ser obrigada a ir à esquadra da minha residência, quando podia perfeitamente contratar uma agência de detectives de qualidade e da minha confiança? E o Estado pagava, que eu garanto, até saía mais barato. Por que não?

Volta e meia surge esta discussão em Portugal: “o meu umbigo é mais liberal que o teu!”. Normalmente começa com alguém a dizer, que um Estado pequenino, onde se pagam poucos impostos, chega melhor a todo o lado. Não há ideias perfeitas, mas a do Estado liberal chega lá perto, unindo o melhor de dois mundos, os baixos impostos, com a omnipresença do Estado.
Como se me dissessem que um caniche, por ser pequenino e irritante, é melhor cão de guarda que a minha Iolanda, uma rottweiler sem regras. Faz sentido?

O que faz sentido é uma pessoa pagar aí uns 20 euros por ano e o Estado tratar dos censos e enviar uma revista com os balanços do país a cada cidadão. Mais nada! E depois cada um garante junto dos privados, o ensino, a saúde, a justiça, a segurança e as pensões que bem entender e que o seu bolso puder pagar. Um verdadeiro Estado liberal não chega a lado nenhum, nem paga aos privados, para chegar na vez dele. Um Estado liberal não se mete, nem na prestação dos serviços, nem na intermediação de negócios, para conseguir prestar esses serviços. Se isto for “ser liberal”, eu assino por baixo já!      
 
Todos os dias, quando saio à rua, entrego livremente – e com gosto! – o meu dinheiro aos privados. Quando vou ao supermercado, ou compro tabaco, ou pago o gás e a luz. Sem querer saber se têm muitos ou poucos lucros, nem o que fazem com eles. Por mim, podem pôr todo o dinheiro no Panamá ou acender ganzas com ele. Tanto se me dá!

Mas será pedir muito, que o dinheiro que eu entrego ao Estado – muito a contragosto! – para pagar os meus impostos, seja investido em serviços públicos e não novamente entregue aos privados, pra que sejam estes a prestar um serviço, que devia ter sido prestado pelo Estado em primeiro lugar?